O Vilão da Tv Digital
Além do Dunga e das vuvuzelas, outro assunto polêmico desta Copa é o delay, ou atraso, nas transmissões dos jogos. Se o seu vizinho grita gol antes de você, será que a imagem na sua televisão é realmente "ao vivo"?
O delay pode ser um grande estraga-prazeres. Renato Claramonte, analista de Recursos Humanos, diz que percebeu o problema em abril, na semifinal da Taça Rio, entre Vasco e Flamengo. O vascaíno conta que soube do pênalti em Léo Moura, jogador rubro-negro, pela reação dos vizinhos. "As pessoas gritaram e, na minha TV, o atacante ainda estava entrando na área. É como se você estivesse assistindo a um replay", reclamou ele.
A irritação com o delay aumentou na Copa do Mundo, afirma Renato. "Imagina em finais ou decisão por pênaltis, vai ser muito chato". No jogo do Brasil contra o Chile, o torcedor, que assistiu ao jogo no Rio Comprido, mediu um atraso de 3 segundos e 56 centésimos. Ele e os amigos chegaram a uma solução barulhenta para o delay: "Sempre que o Brasil cruzava o meio de campo para o ataque, começávamos a soprar as cornetas e não parávamos até o lance acabar. Deu certo. No terceiro gol, a gente não ouviu os gritos dos vizinhos."
Mas por que o delay acontece? A maioria dos especialistas concorda que o atraso que mais incomoda o torcedor se dá pela diferença de velocidade entre o sinal digital e o analógico. O sinal digital, disponível em alguns canais da TV aberta, mas geralmente associado às TVs por assinatura, precisa ser codificado, isto é, a informação que sai da câmera precisa ser transformada para ser transmitida por cabo, satélite ou ar. Ao chegar ao aparelho na casa do telespectador, o sinal passa por uma decodificação para ser assistido. A soma dos tempos de codificação e decodificação é o que gera esse delay longo. Raymundo Barros, Diretor de Engenharia da TV Globo de São Paulo, afirmou que, segundo testes realizados pela emissora, o sinal digital representa um delay de cerca de três segundos, em média. Por isso, torcedores que recebem o tradicional sinal analógico assistem às imagens antes dos consumidores da inovação digital.
Como muitos especialistas defendem a codificação, que não era necessária no sistema analógico, acontece, pois a imagem digital é de maior qualidade e a informação precisa ser reduzida para caber nos meios de transmissão. Seguindo este raciocínio, o HD e o 3D também aumentariam a carga de informação, gerando um pequeno delay, mas que não se compararia àquele gerado pela codificação.
Mas nem mesmo a causa primordial do delay é consensual. Segundo Nelson Hoineff, presidente do Instituto de Estudos da Televisão (IETV), o atraso não decorre da codificação. Se colocadas duas TVs abertas, uma recebendo sinal digital e outra analógico, ambas apresentariam as imagens ao mesmo tempo. Para ele, o delay é fruto apenas da diferença de velocidade das imagens das TVs por assinatura em relação as da TV aberta. "Cada operadora tem uma tecnologia, que percorre um caminho diferente", o que explicaria porque a rapidez das imagens de TVs pagas variam de empresa para empresa. De fato, a imagem que viaja por cabo tende a chegar antes da que segue por satélite. A transmissão neste último caso tende a gerar um atraso maior, uma vez que o sinal leva, em média, um quarto de segundo para percorrer a distância entre o satélite e a terra (36 mil quilômetros na ida e mais 36 mil na volta).
Outros tipos de delay
Além do delay entre operadoras e o formado pela codificação, existe atraso entre os variados canais de TV.
As imagens da Copa estão sendo produzidas pela HBS (Host Broadcast Services), empresa escolhida pela FIFA, que repassa as filmagens para todos os detentores de direitos de transmissão do campeonato. De acordo com a assessoria da Band, os canais transmitem a informação da África para o Brasil por meios diversos e, portanto, é possível que haja delay, mas este ainda não foi medido. Segundo Barros, a imagem chega praticamente ao mesmo tempo em todos os canais brasileiros e não é um atraso considerável.
Como esclareceu ele, a tecnologia de transmissão mais rápida é a do rádio, que chega ao ouvinte em até um segundo depois da geração. Já nas televisões, a mais veloz seria a aberta e analógica, que chega pelo ar e é considerada por muitos como "delay zero". Este delay seria um atraso mínimo, decorrente do tempo que o sinal demora para sair da África, chegar à central brasileira da emissora e ser distribuído para o resto do país. De acordo com o diretor, tanto esse delay entre África e Brasil, quanto o atraso da imagem entre a capital brasileira de recepção e outras cidades, seriam imperceptíveis e, somados, não chegariam a um segundo.
Mas a experiência das pessoas pode ser bem diferente. Segundo Luís Sucupira, editor de conteúdo do Fórum PC, quanto mais para o interior, maior o delay. De acordo com medições feitas por ele e seguidores no Twitter, o atraso na capital do Rio é até oito segundos menor que no interior do estado. Sucupira ressalta também que o delay na internet é o mais grave, cerca de 17 segundos em relação ao rádio. O editor lembra que três segundos podem parecer pouco, mas são uma eternidade em jogos da Copa e em relação à velocidade atual de difusão da informação.
O atraso tem futuro?
A maioria dos especialistas concordam que o delay, ou no mínimo a percepção dele, tem seus dias contados. De acordo com Hoineff, estamos passando por uma transição tecnológica e a tendência é que os brasileiros percebam cada vez menos o delay na medida em que a TV paga se democratize. "Na Europa e Estados Unidos, a abrangência das operadoras é de 98% dos telespectadores. No Brasil, este número é de cerca de 10% somente". Segundo Márcio Carvalho, Diretor de Produtos e Serviços da NET, o atraso será extinto quando o formato digital for o único usado, o que significa que não haveria mais a comparação com o sinal analógico. Sucupira é de opinião similar e defende que, com o sinal digital superando o analógico, o sistema será mais eficiente e o delay desaparecerá.
Para Barros, o futuro está na evolução dos codificadores e decodificadores, que ficarão cada vez mais rápidos, diminuindo o delay para aproximadamente zero. Segundo o diretor, com os atuais avanços tecnológicos, é provável que a próxima Copa, no Brasil, já seja livre dos delays.
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